A Ação Administrativa e a Reforma de 2015
Este trabalho pretende debruçar-se sobre as mudanças introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, publicado a 2 de outubro de 2015, no Contencioso Administrativo Português, mais exatamente na ação administrativa. Esta alteração transformou a ação administrativa comum num regime de ação única, abandonando o regime dual que a caracterizava até ao momento.
A reforma do Contencioso Administrativo de 2002-2004 distinguia, dentro dos processos não urgentes, a ação administrativa comum da ação administrativa especial, que existiam ao lado dos processos urgentes. O Professor Mário Aroso Almeida entende que esta diferenciação advém de uma opção legislativa que estabelece que os processos não devem ter todos a mesma tramitação, devendo-se atender às especificidades de cada tipo de pretensão.
A ação administrativa comum era regulada pelo artigo 37.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, redação do diploma nº 15/2002, de 22 de fevereiro, e abarcava todas as ações que não eram abrangidas por legislação especial. Estas ações englobariam os casos de litígios jurídico-administrativos que não se enquadrassem na incidência típica dos restantes meios processuais. O Professor Vasco Pereira da Silva entende que todo o contencioso do poder dos atos e dos regulamentos estava na ação administrativa especial, logo a ação administrativa comum aplicava-se quando não havia uma atuação em sentido próprio. Ou seja, os atos e os regulamentos esgotam praticamente o universo das ações administrativas, logo a dualidade aplicada era uma mera aparência. A crítica do Professor consistia no facto de a ação administrativa especial acabar por abranger a ação administrativa comum.
A ação administrativa especial era regulada pelo artigo 46.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, redação do diploma n.º 15/2002, de 22 de fevereiro, e abrangia as pretensões emergentes da prática ou omissão de atos administrativos ou normas. Cabem assim na ação administrativa especial, os litígios que impliquem a impugnação ou condenação à prática de atos administrativos ou de normas. Como referido, uma vez que a ação administrativa consiste basicamente em atos e normas, a ação administrativa comum acabava por não ter uma utilidade prática. O pedido podia assim ser apresentado tanto como especial como comum, dependendo apenas do sentido da petição do autor.
A revisão de 2015 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos consagrou uma única ação administrativa comum (artigo 37.º do CPTA), consolidando o acesso aos tribunais e a tutela jurisdicional efetiva (artigo 20.º e 268.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa).
A ação administrativa monopolar é o procedimento sem caráter de urgência dos processos do Contencioso Administrativo, sendo capaz de resolver os litígios jurídico-administrativos. Embora o legislador não tenha feito essa referência, é como se fosse uma ação administrativa comum. A atuação administrativa deixa de qualificar previamente a ação administrativa e passa a atender ao respetivo fim da forma do processo. Deste modo, se o Código não estabelecer uma forma especial de processo urgente (artigo 97.º do CPTA) para a pretensão, esta vai seguir a forma de ação administrativa comum.
O Professor Vasco Pereira da Silva, apesar de crítico do modelo dual prévio, considera que a reforma de 2015 foi, na verdade, uma “reforminha”. Este critica que o legislador ao estabelecer uma ação única, deveria ter resolvido o problema das sub-ações (a condenação de atos administrativos; a impugnação de normas; a condenação à prática de um ato administrativo; a condenação à prática de uma norma; um meio geral), que eram reguladas como se fossem uma realidade autónoma quando se integravam numa outra ação. Passamos assim a ter uma série de falsas ações que integram uma só ação administrativa.
O Professor Mário Aroso de Almeida entende que a unificação das ações não retirou a importância da sua classificação, continuando a ser importante proceder à distinção das pretensões.
Vamos falar mais a fundo da ação de condenação de regulamentos (artigo 37.º alínea a) e 77.º CPTA), que pretende condenar a Administração pela não emissão de regulamentos. Esta é uma invenção portuguesa, não existindo na Europa outro mecanismo semelhante. Este mecanismo começou a ser preparado em 2003-2004, estabelecendo-se que se tratava de uma manifestação da declaração de ilegalidade pela não emissão do regulamento. Ou seja, apesar de poder condenar a Administração a praticar uma certa conduta, era mais vista como uma declaração de ilegalidade.
O Professor Vasco Pereira da Silva entende que, nesta ação, existia uma natureza condenatória visto o juiz não se limitar a fazer uma simples apreciação da ação, mas aplicava uma sanção pecuniária compulsória.
Importante mencionar que alguma doutrina considera que se está perante a violação da separação de poderes, mas que o Professor Vasco Pereira da Silva descarta tal problema. Apenas estaríamos perante uma violação da separação de poderes se o juiz fizesse o regulamento ou alterasse a sua formulação. Uma vez que o juiz apenas condena a Administração a aplicar o regulamento em causa, o problema não se levanta.
Concluindo, a Reforma de 2015 foi de extrema importância para solucionar um problema que afetava a tutela jurisdicional efetiva, mas acabou por ficar aquém do desejado ao não consolidar propriamente a nova ideia de ação administrativa única. No âmbito das ações de condenação, o legislador deu mais poderes ao juiz do que aqueles originalmente consagrados no Contencioso Administrativo.
Bibliografia:
SILVA, Vasco Pereira da; (2013); ‘’O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise – Ensaio sobre as Ações no Novo Processo Administrativo’’; Almedina; 2ª edição
ALMEIDA, Mário Aroso de; (2016); “Manual de Processo Administrativo”; Coimbra: Edições Almedina; 2ª edição
Trabalho realizado por: Ana Silvestre
Subturma 6 (66389)
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