Exposição do tema
Em processo administrativo, o tema das formas do processo declarativo é objeto da Seccção II do Capítulo V da Parte Geral do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (doravante, CPTA), que é constituída apenas por dois artigos, o artigo 35.º e o artigo 36.º.
Resulta do esquema traçado nestes artigos que, sem prejuízo de outros que possam ser consagrados em legislação especial, o regime das formas do processo administrativo declarativo concretiza-se na previsão de uma forma de processo que não é o processo declarativo comum, que se pode qualificar como não urgente e de cinco formas de processo especiais, que o código qualifica como urgentes (estando estas últimas elencadas no artigo 36.º, CPTA: o contencioso eleitoral; os procedimentos de massa; o contencioso pré-contratual; a intimação para prestação de informações, consultas de documentos ou passagem de certidões; a intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias; as providências cautelares).
O foco desta exposição será na matéria dos processos urgentes.
Da redação do artigo 5.º depreende-se que as previsões do artigo 4.º, em matéria de cumulação de pedidos, valem para os processos urgentes do contencioso eleitoral, do contencioso dos procedimento de massa e do contencioso pré-contratual, que o CPTA regula, nos artigos 97.º a 103.º-B, num capítulo ao qual atribui a designação de “ação administrativa urgente” – sendo que no domínio pré-contratual, a própria estrutura das relações jurídicas envolvidas tende a justificar com frequência a cumulação do pedido de anulação do ato pré-contratual com o pedido de condenação à sua substituição por outro que não reincida nas ilegalidades cometidas, para já não falar da cumulação da impugnação do ato pré-contratual com a impugnação do próprio contrato, que o artigo 102º, nº4, admite, aliás, que possa ter lugar a título superveniente, e, até, com um pedido de reparação de danos.
Como referido, o N.º1 do artigo 5.º estabelece que, quando a algum dos pedidos cumulados corresponda uma das formas da ação administrativa urgente, o processo deve seguir a forma da ação urgente, com as adaptações que se revelem necessárias. Ora, tanto os artigos 98.º e 99.º, como o artigo 102.º, já estabelecem, à partida, que os processos urgentes do contencioso eleitoral, do contencioso dos procedimentos de massa e do contencioso pré-contratual seguem a tramitação da ação administrativa com diversas adaptações, que visam torná-la mais célere.
Se houver cumulação é de molde a justificar uma desaceleração do processo, fazendo com que este siga termos que, no todo ou em parte, se afastem do modelo mais célere que resulta dos artigos 98.º, 99.º e 102.º, para que se aproximarem do modelo normal a que obedecem os processos não-urgentes, e que determinar a aplicação ao processo em causa do regime dos processos urgentes, que resulta dos artigos 36.º, N.º2 e 147.º.
Para além disso, à partida, a mera cumulação, no processo impugnatório, do pedido de condenação da Administração à substituição do ato impugnado por outro que não reincida nos mesmos vícios não parece justificar a desaceleração do processo, uma vez que as indagações a realizar incidirão, em qualquer caso, sobre os mesmos factos, para o efeito da aplicação das mesmas normas.
Pode ainda afirmar-se o mesmo quanto à cumulação da impugnação do ato pré-contratual com a impugnação do próprio contrato, como, de resto, parece sugerir o disposto no artigo 102.º, N.º2, ao qual não se associam quaisquer consequências de tramitação à ocorrência dessa cumulação a título superveniente.
No entanto, caberá ao juiz, ouvidas as partes com a máxima celeridade, proceder à necessária ponderação quanto às adaptações a introduzir. E, como é evidente, cabe, desde logo, ao autor, no momento de optar sobre se, nestes domínios deve proceder ou não à cumulação de pedidos, avaliar se não estará a pôr em risco a celeridade e, desse modo, a efetividade da tutela que, à partida, este tipo de processos lhe pode proporcionar.
Acórdão relativo ao tema subjacente
Considerei relevante para o tema subjacente, a análise de um acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo.
Primeiramente, o acórdão datado de 26 de abril de 2018, processo n.º0143/18, de que foi relatora a Senhora Juíza Teresa de Sousa que é relativo ao facto de um processo do contencioso pré-contratual, manter a sua natureza urgente, mesmo após a prolação da sentença e o seu trânsito em julgado, já que não existe qualquer norma que determine o contrário.
A questão que vem colocada pela Recorrente é a de determinar se os prazos aplicáveis num processo judicial de natureza urgente são aplicáveis ao que qualifica como questão tributária, como é a reclamação da conta de custas que não constitui um incidente do processo, mas sim um incidente de natureza meramente tributária, apenas indiretamente relacionado com o processo.
Ora, no acórdão refere-se que a reclamação da conta de custas é um incidente do processo em curso, o qual, neste caso reveste natureza urgente, e não, como defende a Recorrente, um incidente que revista autonomia em relação àquele.
Conclui-se ainda pelo facto de não se estar sequer perante um erro da própria conta, mas antes os fundamentos em que a recorrente se baseou atenta a condenação em custas determinadas na sentença.
No presente acórdão conclui-se que no caso devem ser interpostos e decididos nos prazos estabelecidos nos artigos 102º, nº2 alíneas b) e c) e 147º, nº1, CPTA, correndo tais prazos em férias (nº2 do artigo 36º do CPTA).
É importante referir que o contencioso pré-contratual, vem previsto e regulado nos artigos 100º a 103º-B, CPTA. Através deste meio processual podem ser impugnados (ou pedida a condenação à prática de) atos e normas que digam respeito a procedimentos de formação de certo tipo de contratos públicos.
As ações de contencioso pré-contratual devem ser propostas no prazo de um mês (ao contrário da regra de três meses da ação administrativa) e a contestação apresentada no prazo de 20 dias (ao contrário do prazo regra de 30 dias na ação administrativa).
Ao afirmar que a reclamação não é um incidente autónomo, mas sim parte integrante do processo, o tribunal reforça a ideia de que todos os aspetos relacionados à condenação em custas devem ser tratados dentro da mesma lógica processual.
Por tudo o que foi exposto, considero inequívoca a questão da aplicação do regime dos processos urgentes neste caso pelo facto de ser possível manter uma certa uniformidade no tratamento dos prazos, mas também ao esclarecer que as questões tributárias relacionadas com as custas não se devem desvirtuar da natureza urgente do processo.
Deste modo, concluo afirmando que não poderia ter sido outra a decisão do tribunal tendo em conta a natureza urgente do processo e o facto de não existir qualquer outra norma que determine o contrário.
Bibliografia e legislação consultada
- CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, José - “A Justiça Administrativa: Lições, 10ª edição
- ALMEIDA, Mário Aroso – “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, Coimbra, 2020
- Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro.
No comments:
Post a Comment